“E aqui estou eu outra vez. Perdido. Todas
essas aulas tem se acumulado em minha mente e as obrigações rotineiras, já não me
permitem ter calma. Não consigo lembrar de um dia no qual eu não acorde
simplesmente para resolver problemas, apagar incêndios, ter sempre que dar o
melhor de mim. Estou cansado...” (Pietro)
Mesmo
encantando os alunos, Pietro não reconhecia em si o seu enorme potencial,
acreditava estar sempre andando em círculos e toda a pressão em cima dele
tornava o seu brilho cada vez mais opaco. Seus passos em direção ao carro refletiam
a sua imensa confusão de pensamentos, Dalila, Alice, Escola, Eva, Otelo. Eram
muitas variáveis e apenas uma mente que ansiava por liberdade. O que fazer?
Enfim, Pietro sempre encontrava refúgio nos conselhos de Miguel estava na hora
de procurá-lo, afinal de contas, já era sexta-feira, um chopp cairia muito bem.
Nada melhor do que deixar-se entorpecer.
-
Atende miserável...
Já
era a sétima chamada consecutiva e nada de Miguel. Pietro não suportava a ideia
de ficar em casa sem fazer nada, sentia-se como se estivesse desperdiçando
tempo. Algo tão precioso para ele, momentos livres não poderiam ser perdidos em
frente a uma TV. A sua fome por viver era insaciável e ficar em casa, restrito
a quatro paredes, era extremamente torturante. Talvez ele imaginasse que em
alguma dessas surpresas da vida algo espetacular aconteceria e sua vida mudasse.
Talvez ele encontrasse as respostas que tanto buscava, talvez... Mais dúvidas,
menos certezas.
-
Deixe seu recado na Caixa Postal...
-
Miguel, aqui é o Pietro. Cadê você viado?! To querendo descer para a Orla! Quero
me embriagar. Hoje é o dia!
Uma,
duas, três mensagens e nada! Já eram quase 22h30 e Pietro nem tinha se arrumado
ainda e em Aracaju city se você não encontra algum lugar rápido, a noite se
limitará a comer um sanduíche engordurado em uma praça qualquer. Miguel era a única
companhia.
-
Deixe seu recado na Caixa Postal...
-
Bichona, aqui é o Pietro, de novo. To indo lá pra Orla... Me liga!
Calça,
blusa e um tênis qualquer. Pietro segue com seu carro em direção a Orla e já
que Miguel não atendia, resolveu descobrir o que a noite lhe reservava. Sentado
num barzinho qualquer ele pede a primeira cerveja que desce como água, antes
mesmo do garçom se afastar Pietro já lhe solicita um drink, o mais pesado da
casa. Talvez Pietro quisesse mostrar para si mesmo que poderia se divertir
sozinho, mas isso era apenas uma ilusão.
Mais
drinks, mais cervejas e as coisas já começavam a ficar turvas. O garoto já não
se importava com os olhares de alguns de seus alunos sentados na mesa da
frente, continuava a ligar para Miguel, talvez não mais pela companhia, mas por
uma raiva sem sentido, por uma sensação de abandono.
-
Deixe sua mensagem na Caixa Postal!
- Deixe sua
mensagem na Caixa Postal é o caralho! Onde você está seu viado?! To tomando
todas e a noite tá só começando!!!
Bêbado.
Sozinho, Pietro já não distinguia aluno, amigo ou conhecido. Os garotos antes
sentados à sua frente, já bebiam com o professor, o que aos olhos deles era o
maior barato, mas só para eles.
-
E aew Professor! Vamo rajar!!!
-
Vamo nessa!!! Mas aqui em ajuzim, os bares fecham cedo... São duas da manhã e já
estão expulsando a gente daqui!
-
Que nada, a noite é uma criança e a festa nem começou ainda professor! Aqui é só
o aquecimento!!!
-
Como assim?
-
Tá rolando uma confraternizaçãozinha na casa de Alê. Vamo descer pra lá?
-
Alê? Quem diabos é Alê?
-
Oxe professor!?! Alê??? Aquele monumento em forma de mulher que senta lá no
fundo?! Duvido muito que o senhor nunca a tenha visto!
-
Não sou disso guri... Ela é minha aluna e só. Além do mais, nós não fomos
convidados para a confraternização não é mesmo?
-
É justamente aí que o senhor entra! Ela adora o senhor, se a gente falar que o
Professor Pietro vai, ela libera todo mundo na hora!!!
-
Ahhh quer dizer que eu sou a sua porta de entrada...
-
Justamente!!!
-
Já liguei pra ela, vamo descer professor?!
-
Hã? Como assim?
-
Vamo vamo! Garçom fecha aqui! Vamo nessa!!!!
Desengonçado
e grogue, Pietro não foi capaz de recusar a proposta. Além disso, se todos os
professores frequentavam essas festas, por que ele seria proibido? Por que?
(Som
alto)
-
Aí professor!!! Chegamos! Vamo arrasar! Tenho certeza que a Alê vai adorar
encontrar o senhor!
-
É aqui mesmo?
-
Unhum
-
Mas e os pais dela?
-
Todos viajando... A casa é nossa.
-
Eu não deveria estar aqui, mas sabe do que mais? Foda-se essa porra toda!
-
ÉEEEEEEEEE PROFESSOR!!!
Pietro
dava o primeiro passo para um caminho sem volta. Ele mesmo sabia que aquela
noite não terminaria bem, no entanto, sentindo-se sozinho, o jovem professor
resolveu se libertar de suas preocupações.
(Burburinhos)
Olhares
e muitos comentários paralelos foram as manifestações que receberam Pietro ao
entrar na casa. Os alunos estavam perplexos por ele estar lá, até parecia uma
estrela. O que ele viria fazer ali? E justamente na casa de Alê, que todos
comentavam que tinha uma queda por ele... É... A noite estava só começando.
-
Gennnnnnte! Morri!
-
Como assim menina?!!
-
Olha quem está ali??
-
Quem???
-
O nosso Grande professor! (Risos)
-
Grande eu não sei, mas bêbado com certeza!
-
Ué?? Num é ele o certinho?!
-
A Alê já o viu? Se ela souber disso, vai cair matando!
-
Pera vou chamar!
Deslocado.
Mesmo bêbado, Pietro enxergava os olhares ao seu redor e já se sentia
arrependido de estar ali. Sua mente balançava e seu corpo não respondia ao
mesmo tempo dos seus pensamentos, era no mínimo uma situação desconfortável.
-
Nossa professor! O senhor tem o poder viu?!
-
Como assim menino?
-
Olha quem está vindo na sua direção?
E
lá estava ela, 17 anos e escultural. De fato, a menina era linda e com certeza
o sonho de todos os garotos da escola. Seu sorriso, seu cabelo e todo o resto
envolviam todos ao seu redor, menos um. Aquele que mesmo diante de toda a
beleza a sua frente, não enxergava nada mais do que uma aluna.
-
Professoooooooooor! Ou melhor, Pietro né? Aqui você não é meu professor!
-
Oi Alessandra. Obrigado por me chamar pelo nome, mas eu sou seu professor em
qualquer lugar. Não tem como dissociar isso.
-
Ihhh já tá falando bonito né? Deixa de bobagem, vamo curtir a festa! Não quero
que o senhor venha pra minha casa pra ficar parado. Coloca esse corpo pra
dançar vai...
-
Dançar? Como assim?
A
menina era extremamente voluntariosa e o arrastou para o meio da festa. Pietro
até tentara evitar, mas já era tarde. E qual seria o problema disso afinal? Então
ele dançou! E todos ficaram abismados ao perceber que por trás de todo aquele
jeitão intelectual, ele sabia dançar. Os garotos a sua volta miravam olhares,
alguns de desprezo e muitos de empolgação.
-
Meninaaaaaa, o professor dança demais! Olha só pra aquilo!!!
-
A única coisa que eu vejo é Alê se jogando nos braços dele... Ela vai pegar
hein?!
-
Será???
Pietro
dançara a noite toda e por um momento chegou a se divertir. Algo que não fazia
a muito tempo, sentiu-se solto das amarras e riu, riu muito ao lado de
desconhecidos, alunos que convivam com ele, apenas conviviam. Mesmo assim, ele
não notara as milhares de intenções da garota que fazia questão de dançar todas
as músicas com ele. Talvez se estivesse sóbrio, talvez...
-
Pietro? Posso chamar assim né?
-
Pode Alê! Claro.
-
Vamo sair daqui...
-
Como assim? Você tá em casa pô?!
-
Não Pietro, to cansada... Queria sentar um pouco.
-
Ahhh tá. Tudo bem.
Alê
carregou Pietro pela mão. Na frente de todos e todas, aquilo era uma cena que
ninguém imaginaria ver. Ela não foi para as mesas da festa, pelo contrário, se
dirigiu para a casa, subiu as escadas com ele e todos viram, com certezas twittadas comentários não faltariam naquela
noite.
-
Alê? Pra onde a gente está indo? A festa é lá fora... Vamos voltar. O pessoal
pode pensar bobagem.
-
Que nada, eu só quero pegar um negocinho no meu quarto, num tem nada demais. A
gente não tá fazendo nada!
-
Mesmo assim, não pega bem. To descendo.
-
Ei... Calma, espera. Te juro, senta aí que eu volto já! Tá?
-
Ok. 10 minutos certo? Depois disso, eu desço.
Demorou
menos do que isso e ela voltou. Enrolada na sua toalha, a menina fitou os olhos
de Pietro e foi em direção a ele. Embasbacado e sem saber como reagir, Pietro
esbravejou:
-
Você é louca?
-
Sou. Desde que te olhei, desde que vi esse seu olhar, sabia que você seria o único,
é você que eu quero pra mim. Nunca te vi como professor e hoje você é meu!
-
Sai da...
A
menina disparou uma tentativa de beijo em Pietro, que se esquivou segurando os
braços dela. A toalha caiu e com ela a porta se abre com as amigas de Alê... O
silêncio ecoa nas escadas, Pietro sabe que está mergulhado em merda. Aquela
cena te lembrou o passado, coube a ele apenas uma coisa: Fugir.
Irritado,
preocupado, Pietro cortava as ruas da cidade e com ela um único destino: A casa
de Miguel. Ele sabia que aquela cena, aquela situação poderia destruir sua vida
e ele precisava o quanto antes dos conselhos do seu amigo, desesperadamente,
ele sabia que precisava. Por que diabos fora até lá? Por que diabos foi tão
inocente? Por que?
Ainda
tremendo pela situação, Pietro para o carro na esquina. Mas uma cena o deixa
perplexo. Alice sai do carro de Miguel. Os dois entram juntos na casa dele. Antes
de abrir a porta, ela o beija. Mais uma vez, mais do mesmo. É meu amigo... A
noite não fora programada para acabar bem.