Carpe Diem

E que venha a loucura

E que venha com toda a força

Força que me faça despencar das minhas próprias crenças

Crenças loucas


E que venha a fé

E que venha você

Renda-me!

Lute e enlouqueça também

Fuja da realidade

E se entregue às oportunidades...


Abandone a sua razão insana

E se afogue nesse mar de incertezas

Seja puramente profana

E que o nosso juiz seja a nossa vontade


E que o nosso controle e bom senso sejam passageiros

Viajantes de longa data

E que se percam na nossa odisséia

Na nossa aventura

Com nossa loucura

Buscando o porquê de ainda existir...

(Noturno)

quinta-feira, 4 de abril de 2013

PARTE 3: MAIS DO MESMO


            E aqui estou eu outra vez. Perdido. Todas essas aulas tem se acumulado em minha mente e as obrigações rotineiras, já não me permitem ter calma. Não consigo lembrar de um dia no qual eu não acorde simplesmente para resolver problemas, apagar incêndios, ter sempre que dar o melhor de mim. Estou cansado...” (Pietro)

            Mesmo encantando os alunos, Pietro não reconhecia em si o seu enorme potencial, acreditava estar sempre andando em círculos e toda a pressão em cima dele tornava o seu brilho cada vez mais opaco. Seus passos em direção ao carro refletiam a sua imensa confusão de pensamentos, Dalila, Alice, Escola, Eva, Otelo. Eram muitas variáveis e apenas uma mente que ansiava por liberdade. O que fazer? Enfim, Pietro sempre encontrava refúgio nos conselhos de Miguel estava na hora de procurá-lo, afinal de contas, já era sexta-feira, um chopp cairia muito bem. Nada melhor do que deixar-se entorpecer.

            - Atende miserável...

            Já era a sétima chamada consecutiva e nada de Miguel. Pietro não suportava a ideia de ficar em casa sem fazer nada, sentia-se como se estivesse desperdiçando tempo. Algo tão precioso para ele, momentos livres não poderiam ser perdidos em frente a uma TV. A sua fome por viver era insaciável e ficar em casa, restrito a quatro paredes, era extremamente torturante. Talvez ele imaginasse que em alguma dessas surpresas da vida algo espetacular aconteceria e sua vida mudasse. Talvez ele encontrasse as respostas que tanto buscava, talvez... Mais dúvidas, menos certezas.

            - Deixe seu recado na Caixa Postal...
            - Miguel, aqui é o Pietro. Cadê você viado?! To querendo descer para a Orla! Quero me embriagar. Hoje é o dia!

            Uma, duas, três mensagens e nada! Já eram quase 22h30 e Pietro nem tinha se arrumado ainda e em Aracaju city se você não encontra algum lugar rápido, a noite se limitará a comer um sanduíche engordurado em uma praça qualquer. Miguel era a única companhia.

            - Deixe seu recado na Caixa Postal...
            - Bichona, aqui é o Pietro, de novo. To indo lá pra Orla... Me liga!

            Calça, blusa e um tênis qualquer. Pietro segue com seu carro em direção a Orla e já que Miguel não atendia, resolveu descobrir o que a noite lhe reservava. Sentado num barzinho qualquer ele pede a primeira cerveja que desce como água, antes mesmo do garçom se afastar Pietro já lhe solicita um drink, o mais pesado da casa. Talvez Pietro quisesse mostrar para si mesmo que poderia se divertir sozinho, mas isso era apenas uma ilusão.
            Mais drinks, mais cervejas e as coisas já começavam a ficar turvas. O garoto já não se importava com os olhares de alguns de seus alunos sentados na mesa da frente, continuava a ligar para Miguel, talvez não mais pela companhia, mas por uma raiva sem sentido, por uma sensação de abandono.

            - Deixe sua mensagem na Caixa Postal!
            - Deixe sua mensagem na Caixa Postal é o caralho! Onde você está seu viado?! To tomando todas e a noite tá só começando!!!

            Bêbado. Sozinho, Pietro já não distinguia aluno, amigo ou conhecido. Os garotos antes sentados à sua frente, já bebiam com o professor, o que aos olhos deles era o maior barato, mas só para eles.

            - E aew Professor! Vamo rajar!!!
            - Vamo nessa!!! Mas aqui em ajuzim, os bares fecham cedo... São duas da manhã e já estão expulsando a gente daqui!
            - Que nada, a noite é uma criança e a festa nem começou ainda professor! Aqui é só o aquecimento!!!
            - Como assim?
            - Tá rolando uma confraternizaçãozinha na casa de Alê. Vamo descer pra lá?
            - Alê? Quem diabos é Alê?
            - Oxe professor!?! Alê??? Aquele monumento em forma de mulher que senta lá no fundo?! Duvido muito que o senhor nunca a tenha visto!
            - Não sou disso guri... Ela é minha aluna e só. Além do mais, nós não fomos convidados para a confraternização não é mesmo?
            - É justamente aí que o senhor entra! Ela adora o senhor, se a gente falar que o Professor Pietro vai, ela libera todo mundo na hora!!!
            - Ahhh quer dizer que eu sou a sua porta de entrada...
            - Justamente!!!
            - Já liguei pra ela, vamo descer professor?!
            - Hã? Como assim?
            - Vamo vamo! Garçom fecha aqui! Vamo nessa!!!!

            Desengonçado e grogue, Pietro não foi capaz de recusar a proposta. Além disso, se todos os professores frequentavam essas festas, por que ele seria proibido? Por que?
           
            (Som alto)

            - Aí professor!!! Chegamos! Vamo arrasar! Tenho certeza que a Alê vai adorar encontrar o senhor!
            - É aqui mesmo?
            - Unhum
            - Mas e os pais dela?
            - Todos viajando... A casa é nossa.
            - Eu não deveria estar aqui, mas sabe do que mais? Foda-se essa porra toda!
            - ÉEEEEEEEEE PROFESSOR!!!

            Pietro dava o primeiro passo para um caminho sem volta. Ele mesmo sabia que aquela noite não terminaria bem, no entanto, sentindo-se sozinho, o jovem professor resolveu se libertar de suas preocupações.

            (Burburinhos)

            Olhares e muitos comentários paralelos foram as manifestações que receberam Pietro ao entrar na casa. Os alunos estavam perplexos por ele estar lá, até parecia uma estrela. O que ele viria fazer ali? E justamente na casa de Alê, que todos comentavam que tinha uma queda por ele... É... A noite estava só começando.

            - Gennnnnnte! Morri!
            - Como assim menina?!!
            - Olha quem está ali??
            - Quem???
            - O nosso Grande professor! (Risos)
            - Grande eu não sei, mas bêbado com certeza!
            - Ué?? Num é ele o certinho?!
            - A Alê já o viu? Se ela souber disso, vai cair matando!
            - Pera vou chamar!

            Deslocado. Mesmo bêbado, Pietro enxergava os olhares ao seu redor e já se sentia arrependido de estar ali. Sua mente balançava e seu corpo não respondia ao mesmo tempo dos seus pensamentos, era no mínimo uma situação desconfortável.

            - Nossa professor! O senhor tem o poder viu?!
            - Como assim menino?
            - Olha quem está vindo na sua direção?

            E lá estava ela, 17 anos e escultural. De fato, a menina era linda e com certeza o sonho de todos os garotos da escola. Seu sorriso, seu cabelo e todo o resto envolviam todos ao seu redor, menos um. Aquele que mesmo diante de toda a beleza a sua frente, não enxergava nada mais do que uma aluna.
           
            - Professoooooooooor! Ou melhor, Pietro né? Aqui você não é meu professor!
            - Oi Alessandra. Obrigado por me chamar pelo nome, mas eu sou seu professor em qualquer lugar. Não tem como dissociar isso.
            - Ihhh já tá falando bonito né? Deixa de bobagem, vamo curtir a festa! Não quero que o senhor venha pra minha casa pra ficar parado. Coloca esse corpo pra dançar vai...
            - Dançar? Como assim?

            A menina era extremamente voluntariosa e o arrastou para o meio da festa. Pietro até tentara evitar, mas já era tarde. E qual seria o problema disso afinal? Então ele dançou! E todos ficaram abismados ao perceber que por trás de todo aquele jeitão intelectual, ele sabia dançar. Os garotos a sua volta miravam olhares, alguns de desprezo e muitos de empolgação.

            - Meninaaaaaa, o professor dança demais! Olha só pra aquilo!!!
            - A única coisa que eu vejo é Alê se jogando nos braços dele... Ela vai pegar hein?!
            - Será???

            Pietro dançara a noite toda e por um momento chegou a se divertir. Algo que não fazia a muito tempo, sentiu-se solto das amarras e riu, riu muito ao lado de desconhecidos, alunos que convivam com ele, apenas conviviam. Mesmo assim, ele não notara as milhares de intenções da garota que fazia questão de dançar todas as músicas com ele. Talvez se estivesse sóbrio, talvez...

            - Pietro? Posso chamar assim né?
            - Pode Alê! Claro.
            - Vamo sair daqui...
            - Como assim? Você tá em casa pô?!
            - Não Pietro, to cansada... Queria sentar um pouco.
            - Ahhh tá. Tudo bem.
           
            Alê carregou Pietro pela mão. Na frente de todos e todas, aquilo era uma cena que ninguém imaginaria ver. Ela não foi para as mesas da festa, pelo contrário, se dirigiu para a casa, subiu as escadas com ele e todos viram, com certezas twittadas comentários não faltariam naquela noite.

            - Alê? Pra onde a gente está indo? A festa é lá fora... Vamos voltar. O pessoal pode pensar bobagem.
            - Que nada, eu só quero pegar um negocinho no meu quarto, num tem nada demais. A gente não tá fazendo nada!
            - Mesmo assim, não pega bem. To descendo.
            - Ei... Calma, espera. Te juro, senta aí que eu volto já! Tá?
            - Ok. 10 minutos certo? Depois disso, eu desço.

            Demorou menos do que isso e ela voltou. Enrolada na sua toalha, a menina fitou os olhos de Pietro e foi em direção a ele. Embasbacado e sem saber como reagir, Pietro esbravejou:

            - Você é louca?
            - Sou. Desde que te olhei, desde que vi esse seu olhar, sabia que você seria o único, é você que eu quero pra mim. Nunca te vi como professor e hoje você é meu!
            - Sai da...

            A menina disparou uma tentativa de beijo em Pietro, que se esquivou segurando os braços dela. A toalha caiu e com ela a porta se abre com as amigas de Alê... O silêncio ecoa nas escadas, Pietro sabe que está mergulhado em merda. Aquela cena te lembrou o passado, coube a ele apenas uma coisa: Fugir.
            Irritado, preocupado, Pietro cortava as ruas da cidade e com ela um único destino: A casa de Miguel. Ele sabia que aquela cena, aquela situação poderia destruir sua vida e ele precisava o quanto antes dos conselhos do seu amigo, desesperadamente, ele sabia que precisava. Por que diabos fora até lá? Por que diabos foi tão inocente? Por que?
            Ainda tremendo pela situação, Pietro para o carro na esquina. Mas uma cena o deixa perplexo. Alice sai do carro de Miguel. Os dois entram juntos na casa dele. Antes de abrir a porta, ela o beija. Mais uma vez, mais do mesmo. É meu amigo... A noite não fora programada para acabar bem.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

PARTE 2: BILHETE


            Quão bravo você poderia ser diante do seu grande amor? Qual seria a medida de sua coragem? De sua força? Do que você seria capaz? Abandonar o próprio filho? Largar tudo em nome de uma aventura?
            Todas essas dúvidas explodiam na mente de Pietro. O que o pai dele teria feito? Seria por isso que sua mãe o odiava tanto? Ele a abandonara? Algo não se encaixava naquela história e ele sabia que a única pessoa capaz de responder isso seria justamente aquela que ele mais temia: Dona Júlia. Fria, às vezes até um pouco calculista, mas ainda assim extremamente sagaz. Se por acaso, Pietro apenas levantasse o nome do pai, ela saberia que ele descobrira os diários e com certeza se fecharia em sua fortaleza mais implacável, o silêncio.
            Durante todos os anos que Pietro convivera com ela jamais ouvira elogios sobre o pai, na verdade ele sequer ouvira falar nele, apenas que tinha ido embora e só. Quantos “dias dos pais” Pietro passou sozinho? Quantas vezes olhou para os seus coleguinhas e percebera que havia algo de errado? O único a ir para casa sozinho... O único a não ter o que desenhar com o título de família... A infância não tinha sido fácil, a adolescência muito menos. A mãe sempre ausente mergulhada em trabalho e o pai apenas uma nuvem, uma silenciosa memória da qual ninguém ousava deslumbrar. Tudo era muito anuviado. Ninguém comentava, ninguém explicava, e assim ele ia crescendo em meio a murmúrios e suspeitas. Tudo sempre fora uma sombra e aquele diário poderia ser uma luz no fim do túnel de mistérios ao qual Pietro acostumara a conviver.
Mesmo assim, não havia muito tempo para isso, pois o trabalho se acumulava e com o vestibular estava cada vez mais próximo, para Pietro, se iniciava a pior parte do ano, onde todas as expectativas dos seus alunos se depositavam nele. Quais os assuntos cairiam? Quais questões? Não bastava lecionar o ano inteiro, se a sua revisão não fosse focada na prova, tudo que você construiu ao longo do ano iria por água abaixo. Por um lado completamente compreensível, mas por outro seria completamente martirizante.
Pietro mal sabia onde posicionar os seus pensamentos e já se via aprisionado a uma série de rotineiras obrigações. Se não bastasse tudo isso ainda havia Dalila que não parava de ligar e correr atrás do garoto. Afinal de contas, as apostas dela se direcionavam a ele, com uma boa revisão o curso estaria garantido e o dinheiro também. No final de tudo, Pietro sabia que o sistema o engolira e que seria muito difícil não ser digerido por ele.

...

Aracaju, 10 de outubro de 2012 (às 06h15 da manhã).

Mais um dia corrido. Era o que esperava por Pietro. Ainda meio desnorteado por causa dos acontecimentos recentes, o jovem professor titubeava em suas memórias e angústias. Ansioso por resolver os seus problemas e exorcizar os seus demônios internos, Pietro se enclausurava ainda mais em si e, apesar de irônico, era quando ele se mostrava mais talentoso.
As poesias e textos literários abordados por ele em sala estavam carregados de sua tristeza e tornava ainda mais verossímil o sofrimento dos românticos byronianos, as angústias dos existencialistas e as divagações de muitas outras artes. A tristeza dele o tornava suas aulas brilhantes e os alunos, ainda que presos a uma espécie de escravidão intelectual partilhavam com ele, as suas inquietações. Sua mente efusiva fazia daquele jovem professor uma explosão de ideias e reflexões. A vontade de mudar, de conquistar era clara nos olhos dele e aquela vida totalmente contida, reprimida por anos de más escolhas e temeridades reproduziam aulas extremamente profundas. Pietro incorporava os seus personagens e era ali que ele por um breve momento, ainda que curto, libertava a sua alma.
(Burburinhos de alunos)
            - Nossa que hoje ele está inspirado...
            - Finalmente né? Até pouco tempo atrás ele parecia um defunto ambulante!
            - Não fala assim dele, esses olhinhos tristes deixam ele tão fofinho, dá até vontade de pegar para criar!
            - Tenho certeza que ele pega aluna!
            - Mais fácil ele ser gay! (Risos)
            - Silêncio pessoal, não quero saber de conversa na minha aula, bora! Mergulhem no assunto!
            - Ixe! Será que ele percebeu?
- Duvido muito, ali é muito voador!
- Que história é essa que Pietro é gay?
- Sai daí pô! Isso é coisa desses meninos invejosos!
- Invejosos nada! Mal vejo em balada e quando o encontro ele está ou sozinho ou com um amigo! Atestado de gay!
- Isso não quer dizer nada!!!
- Ihhh tá defendendo demais!
- Já pegou né? Confessa!
- Nunca tive sorte!
- A irmã de uma amiga minha disse que ele é bom...
- Como assim???
- Vocês vão ficar aí fuçando a vida do professor ou vão deixar eu assistir aula?
- Ihhh parou gente, Helena começou a dar chilique!
- Deixa essa idiota aí, aposto que ela tem uma queda pelo professor! Mas vamos parar porque ele já olhou para cá duas vezes... Já já ele estoura...

Helena apenas sorriu. Um sorriso sarcástico, quase de desprezo. Não entendia como pessoas poderiam ser tão fúteis e em certa medida tão cruéis. Aqueles comentários nos ouvidos errados certamente prejudicariam o professor e numa cidade como Aracaju, não importa quem realmente você é, mas sim aquilo que falam sobre você. Mesmo sendo de fora, ela já havia aprendido as regras do jogo. Não se importava que falassem dela, mas não admitia que cometessem injustiças com os outros, especialmente Pietro. Aos olhos dela, o melhor professor da Escola. Dedicado, impetuoso e principalmente sincero. Não fazia questão de esconder suas opiniões ou de apenas concordar com os outros para agradar o público, Pietro era exatamente aquilo que se apresentava, ainda que por trás de seu brilho, houvesse uma tristeza contida. Helena percebera isso há muito tempo, no entanto, nunca se sentira a vontade para conversar com ele. Até porque, Pietro jamais abriria esse espaço para ela, provavelmente nem saberia qual era o seu nome. Então que moral ela teria de tentar ajudá-lo? E ajudá-lo como? Ela, apenas uma estudante. Ele, um brilhante professor. Bastava então, garantir ao seu modo, o respeito dos outros em relação a ele. Não era uma simples questão de protecionismo, mas sim de amizade platônica. Mas um dia, a coragem deveria brotar e com ela o silêncio seria rompido.

- Bem galerinha, como o meu tempo acabou, nos vemos na próxima aula ok? Não se esqueçam de fazer as devidas atividades de casa. Até mais.

Os alunos mal escutam Pietro e saem aos montes, descendo as escadas, empurrando uns aos outros, o que importava era ir para casa, buscar o descanso e a nova balada. De certa forma, Pietro ainda se sentia um garoto e assistia de camarote aquela cena, mesmo sob a ótica de professor adulto, talvez ele lembrasse um tempo que fosse menos infeliz, onde a angústia e preocupação repousasse apenas nos sermões de Dona Júlia.
Estático e pensativo, Pietro mergulhava mais uma vez na sua melancolia, talvez o dia lhe trouxesse respostas, ou simplesmente mais perguntas. Cansado e sozinho Pietro não percebera que havia deixado seu precioso diário em cima da mesa, sua última anotação estava à mostra em forma de bilhete, preso entre as páginas de seus escritos, fruto de seus devaneios madrugais

Hoje eu acordei com uma vontade danada de conquistar o mundo
De fazer acontecer e conhecer coisas novas
Descobrir
Sentir
Viver...
Mas então lembrei que precisava dar aula.
Desistir de todos os meus doces sonhos
Levantei
Fui trabalhar!

Aquele diário seria um prato cheio para as fofocas estudantis, no entanto, uma mão delicada e compreensiva o salvou...

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Capítulo 9: Apenas amigos?


PARTE 1 – Estranhos encontros...

Aracaju, em algum momento de 1985.

            Perdido. Talvez essa seja a melhor definição para o estado ao qual me encontro. As dívidas se acumulam e eu não consigo encontrar um modo de me libertar dessa condição ultrajante. Não suporto mais tocar em praças, ruas e avenidas. Sinto meu talento sendo desperdiçado aos sons de buzinas e apitos de guardas de trânsito, até encontro harmonia em toda essa balburdia, no entanto, é impossível competir contra o pandemônio causado por eles, no final das contas eu sou apenas mais um ruído no meio de tantos. Se não fosse por Júlia jamais estaria aqui. Sinto-me culpado por tudo, porque sei que no final das contas eu causei isso, mesmo assim não posso me entregar, o menino e ela precisam de mim, tenho certeza que muito em breve encontrarei uma solução.

            Os pensamentos envolviam Otelo como se ele fosse um mero fantoche do destino. A gravidez precoce de Júlia, a rejeição dos pais, a oposição dos amigos, tudo se somava contra aquela jovem casal que naquele momento se deparavam contra a selva aracajuana. Aqui, as coisas podem parecer simples, apenas parecem. Todos se conhecem e todos se sentem no direito de julgar, opinar, intervir. O casal Otelo e Júlia se tornou referência de como as coisas podem dar errado na mistura de diferentes classes sociais. Para os pais de Otelo e toda a sua família, ele teria sido um trouxa que não tirou vantagem dos recursos de Júlia, já para os entes queridos de Júlia, Otelo seria um espertalhão que tentara conquistar esses recursos através da gravidez da jovem menina e ela, bem, ela seria apenas mais uma trouxa que caíra nesse golpe. Enfim, no final das contas para a nossa boa sociedade, sobravam os vilões para essa história e as vítimas praticamente não existiam.
            Otelo se via diante de um dilema no qual o obrigava a se submeter a subempregos para o bem de todos. Tocar em barzinhos, praças, ruas e quaisquer lugares que o recebesse, tudo para ganhar uns trocados, tudo para garantir que as coisas iriam dar certo. Era só uma fase pensara ele, mas era um momento que se estendia por horas, dias, semanas, meses e simplesmente nada mudava. Assistir o seu grande amor se humilhar em casas de família era martirizante, no entanto, necessário. Opções? Pouquíssimas e soluções mais raras ainda. Dessa maneira, ambos percebiam seus sonhos se esvair pelas mãos... Ela de futura grande doutora a secretária do lar e ele de brilhante professor de música a tocador de beira de esquina. Nada poderia mudar aquele triste destino. Poderia?

            Notícia boa! Hoje recebi uma ligação sobre a possibilidade de exercer a minha profissão, acredito que poderei sair em breve dessa vida de madrugadas, a qual apenas a exerço porque preciso do dinheiro, o único elemento que entorpece minha alma e me mantém de pé é o álcool. Sei que às vezes exagero um pouco, mas para suportar tudo isso somente iludindo a mente e com ela o meu espírito. Júlia está cada vez mais fria, mas tenho certeza que se esse emprego vingar, eu conseguirei resolver as coisas.

            O telefonema não poderia ter vindo em melhor hora. A proposta de emprego seria naquele momento o porto seguro que Otelo tanto precisaria para se livrar das ilusões mundanas as quais ele tinha se permitido entregar. Não era fácil e em nenhum momento ele buscara esse caminho, mas suportar noites em claro e o olhar de crítica de seu grande amor era demais para ele, o álcool não era uma solução, mas com certeza era uma fuga cada vez mais atrativa para os seus momentos de desilusão e torpor, talvez se essa nova proposta de emprego vingasse, talvez as coisas pudessem mudar, mas todas as possibilidades se resumiam a um mero “talvez” e ele sabia que mesmo com a proposta não havia nada concreto. Portanto, comemorar ainda era cedo, mas alimentar esperanças ainda que frágeis e tardias já eram possíveis. Finalmente ele poderia exercer o que tanto sonhou. Mesmo sem diploma, mesmo sem título, ele poderia iniciar sua carreira de professor naquela pequena escola, que motivada por uma visão progressista poderia em breve se tornar um grande núcleo de conhecimento, algo diferenciado para a pequena e altiva cidade de Aracaju.

            Fui hoje à escola, passaram-me uma série de testes e acredito ter me saído bem. Quando toquei o violino pude perceber que os outros professores e inclusive a bela e jovem diretora exaltaram os olhos para mim. A remuneração é baixa, mas pelo menos é digna e concede uma série de direitos que no futuro eu poderei usufruir em prol do menino e da minha amada Júlia. Mesmo assim, sinto-a cada vez mais distante de mim, fria e endurecida pelo duro trabalho, eu percebo que ela não é mais a mesma e talvez esteja se transformando em algo que eu mal sei o que será. Mesmo assim, eu a amo incondicionalmente, sempre amarei e daria minha vida para fazê-la feliz.
            Mesmo contratado, Otelo preferira não contar nada a Júlia. Tinha convicção que ao final do ano, economizando bastante e juntando todos os seus vencimentos, poderia promover a entrada numa casinha pequena, mas ainda assim digna, para que eles pudessem sair daquele quarto e sala e viver de fato como um casal. Tudo estava planejado na cabeça de Otelo e ele se sentia mais confiante e mais seguro do que estava fazendo. Assinou o contrato certo de que estava fazendo a coisa certa, garantia de trabalho, salário mínimo e até mesmo um generoso seguro de vida para Júlia e o seu menino que estava por vir, claro, ninguém deseja morrer, ao mesmo tempo, ninguém conhece o dia de amanhã e justamente por isso era necessário salvaguardar cada minuto daquela criança.
            Otelo previa que em poucos anos poderia dar a vida que Júlia sonhou, bastava ele se consolidar na escola que crescia a nível exponencial e com ela o talento dele que era percebido por muitos. De professor, já se tornara braço direito da diretora que o consultava obrigatoriamente antes de tomar qualquer decisão. Júlia mal imaginava o que acontecia, nos pensamentos dela, Otelo ainda tocava em praças e como ele ainda ganhava pouco apesar da sua maiúscula importância na estrutura da escola, o seu potencial era cada vez mais percebido, em alguns casos até demais.

            Dia corrido hoje, precisei esquadrinhar a formação de algumas turmas para o ano que vem, além disso, orientei a minha diretora a investir um pouco mais, ampliar o espaço e é claro fornecer mais serviços. Apesar disso, ainda continuo ganhando menos do que deveria, mas acredito que em breve, com crescimento do meu grau de importância na escola, eu conquiste cada vez mais espaço e é claro cada vez mais melhorias na minha remuneração. Não tenho nada do que reclamar dali, sei que em breve ganharei um papel ainda maior do que eu já exerço. Mesmo assim, algo chamou minha atenção hoje, foi a quarta vez que eu sou o último a sair da reunião e a sensação que eu tenho é que ela me segura ao máximo, para que eu solucione, problemas e ainda a sua vida conjugal. Ultimamente ela tem reclamado muito do marido e de que se arrepende ter se casado tão jovem.

            Sem jeito, tímido e profundamente sem graça. Esse era Otelo após mais uma insinuação de sua diretora. Aquilo já tinha se tornado recorrente e por mais que ele evitasse ser o último a sair da sala dela, ela fazia de tudo para criar essa situação. Otelo se esquivava, mas ela insistia e já dizia abertamente que juntos eles poderiam construir um império, que ela largaria o marido para iniciar um novo amor com ele. Perto de Otelo, aquela dura e fria diretora se sentia uma menina e mesmo com toda a sua beleza e sedução, Otelo resistira a ela, Júlia era o seu grande amor e somente a ela deveria se entregar. Mesmo assim, por mais que ele dissesse não e que deixasse bem claro que a relação entre eles era estritamente profissional, ela não aceitara e assim Otelo ia se perdendo entre os assédios de sua chefe e a frieza do seu grande amor, que dura e ríspida o deixavam ainda mais depressivo. O trabalho que ele tanto sonhara estava dia a dia se tornando um inferno do qual ele não poderia se queixar, pois sem ele, perderia tudo e com ele perderia Júlia, que não entendia o fato dele sempre estar sem tempo.

            Meu Deus! Acho que tudo está perdido, ela está louca e me coloca em situações das quais eu não sei mais me desvencilhar, nessa altura do campeonato não posso mais contar a Júlia o que está acontecendo porque ela muito provavelmente se sentirá traída por eu não ter dito sobre o meu trabalho. Por outro lado, Eva deixou bem claro, ou eu largo Júlia para ficar com ela ou eu perderei tudo. Ela não pode fazer isso comigo! Como eu sustentarei meu filho? Como eu irei manter os sonhos de Júlia? Se eu contar a verdade perderei ela, se eu mentir terei que traí-la! Não existe solução, não existe alternativa... Ou existe? Meu Deus! Existe apenas um caminho...

Aracaju, num quarto escuro de 2012...

            Eva? Não é possível! Eva Sales conheceu meu pai?

quinta-feira, 1 de novembro de 2012


PARTE 4: O diário

            E se tudo na sua vida perdesse o sentido? Se seus sonhos fossem apenas ilusões distantes, opacas e entristecidas pelo tempo? Se as cores de seus dias se resumissem a meros tons de cinza? Pois é, eu não sabia muito bem o que fazer. Sentia ainda um mal-estar devido a noite passada, que além de ter ido para casa tarde, não conseguira fechar os olhos, descansar. Minha cabeça estava pesada e eu arrastava meu corpo pelos corredores da escola de sala em sala como se apenas estivesse alternando sessões de tortura, perdia-me em meus próprios pensamentos e como uma tartaruga fechava-me ainda mais na armadura dos meus devaneios. O dia não seria tão cheio assim, eram apenas dez aulas e logo logo eu estaria em casa para descansar. No entanto, sabia que precisava ir logo à casa de Dona Júlia, pois minha querida mamãe solicitara os meus serviços braçais em sua pequena reforma. Sozinho, possivelmente eu não daria conta, justamente por isso convidar Miguel se apresentava para mim como uma opção óbvia, além disso, precisava conversar com ele sobre tudo que estava acontecendo. Tique taque, o tempo corria, as opções de escolha eram muitas, no entanto, as certezas eram cada vê mais escassas. O telefone toca...

            - Miguel???
            - Fala boiolinha! Quanto tempo! Esqueceu seu amor foi??
            - O mesmo fresco de sempre né?
            - É claro! Cheio de amor para te dar! (Risos)
            - Cara, precisarei da sua ajuda... Tá afim de fazer uma forcinha?
            - Como assim?
            - Dona Júlia solicita os meus serviços. Ela está querendo que eu ajeite o quarto da minha irmã, muito provavelmente não será apenas isso, enfim... Você entendeu.
            - Para beber ninguém me chama né boiola? Mas tudo bem. Quando é?
            - Amanhã pela manhã, às oito horas. De lá queria surfar um pouco... O que você acha?
            - Poxa, gostei! A gente sai de lá meio-dia e depois segue para praia. A noite rola até uma baladazinha, o que acha?
            - Cara, não vou garantir a balada porque trabalharei no domingo, mas a praia tá certa!
            - Tu é uma “Isaura” mesmo né? Quem diabos trabalha no domingo?
            - Eu?
            - É! Só você mesmo! Você trabalha demais cara!!! Isso vai acabar te matando!
            - Ihhh lá vem sermão... Ói, a gente se vê amanhã então?
            - Tá boiola! Mas vê se me ouve...
            - Miguelito, preciso ir, depois nos falamos e aí você me xinga o quanto quiser! Xerunda.
            - Calm...

            Desliguei. Não havia tempo para aquilo. Eu sei que ele tinha razão, mas afinal de contas o que diabos eu poderia fazer? O sistema era assim. Ele te consome, absorve todas as suas horas vagas de tal maneira que você passa a viver em função dele, tudo gira ao redor da Escola, de uma forma, que depois de certo tempo, ela passa a habitar você. Já cansei de acordar no meio da madrugada, preocupado se estava ou não na hora de ir trabalhar, de simplesmente não conseguir relaxar por ter que preparar aulas, apostilas, provas, simulados, aulas extras e tudo que o sistema exigia de mim. É meu amigo, a vida não era fácil, não era mesmo.

...

Sábado pela manhã

            Ir à casa de Dona Júlia era extremamente desconfortável para mim, não sabia como me portar, mal sabia como olhar nos olhos dela, era um misto de tristeza e dor por angústias e mágoas mal curadas de um passado recente. Feridas continuavam abertas entre nós e eu mal sabia que talvez elas nunca cicatrizassem. Ao menos Miguel iria comigo, o trabalho árduo e a boa conversa me distrairiam por algum momento, o suficiente para não pensar nos problemas cotidianos.
            Ao chegar, Miguel esperava-me na porta e rapidamente suspirou

            - Atrasado mais uma vez não é doutor Pietro?
            - Cara foi mal, dormi demais...
            - Claro né? Você nunca descansa... Passa horas a fio na madrugada, o que diabos você tanto busca? O que tanto te incomoda?
            - Ihhh vai começar é??? Vamos começar logo essa mudança porque ainda quero surfar hoje.
            - Isso... Vai sempre se esquivar da conversa não é? Tudo bem, você é que sabe!

            Em meus pensamentos eu sabia que Miguel estava certo, mas o que eu poderia responder? Não fazia ideia do que buscava, do que queria... A única certeza que tinha é que naquele momento existia algo que me incomodava: Alice. E essa agora somada ao poder de Dalila e a interferência da Escola, bem, não era uma combinação agradável.
            Passamos horas desmontando guarda-roupas e camas, o que era para ser uma mera mudança de móveis de um quarto para o outro se transformou num reforma na casa inteira. Dona Júlia sabia que não deixaríamos trabalho por fazer e justamente por isso, fez o que eu já esperava, tirou proveito. Mal almoçamos e na esperança vã de terminar o serviço logo para usufruirmos o melhor da praia voltamos ao trabalho, contudo, o trabalho não acabava. Sempre apareciam coisas novas, móveis novos. Quando eu menos percebi já estava ajeitando encanamento e mexendo na parte elétrica da casa.

            - Ei Pietro, que quarto é aquele?
            - Cara, não sei, vamos terminar isso logo porque eu quero ir à praia!
            - Man desiste disso vai! Já são quase 16horas. Mesmo se fôssemos agora encontraríamos apenas resto de macumba, traveco e maconheiro! Ou seja, tudo que você gosta!
            - Porra nenhuma, ainda teria os usuários de crack, presentes do nosso ilustre governo e de uma sociedade hipócrita que nega o que está diante de seus olhos. Uma sociedade podre e decadente movida por modismos consumistas propagandeados pelas nossas emissoras de Tv!
            - Ihhhh falou o intelectual! Está parecendo aqueles esquerdóides que você tanto ama na Universidade.
            - Esquece vai!
            - Calma bichinha! É só uma brincadeira. Mas me diga! O que tem naquele quarto?
            - Cara, não inventa mais trabalho vai! To perdendo meu único dia de folga nessa bosta de reforma que Dona Júlia inventou!
            - Não fala assim do meu amor!
            - Vai te fu... Vai Miguel!
            - Cara, já estamos na merda, pelo menos vamos fazer o serviço completo.
            - Man, não sei não! Dona Júlia nunca me deixou entrar nesse quarto, é melhor deixar isso aí!
            - To entrando!

            Miguel era assim, não havia protocolos ou obstáculos que o impedissem. Sempre com uma visão positiva das coisas, era o tipo do cara que sempre via a metade do copo cheio. Não sei o que seria de mim sem ele, era meu irmão. O irmão que nunca tive, o pai que nunca me abraçou e de que nunca Dona Júlia falou a respeito.

            - Cara! Que bagunça isso aqui ó?! Isso sem falar que a luz não tá funcionando direito. Sobe aí que eu vou desligar o disjuntor!
            - Desliga essa merda direito, não quero morrer grudado no assoalho de Dona Júlia.
            - Calma bichi...
            - Ahhhh

            A queda foi rápida. Mas isso não a tornou menos dolorosa, não havia levado em consideração que talvez a escada não suportasse o meu peso, ou simples fato dela estar em falso. De qualquer maneira, quando menos percebi, já estava no chão. O impacto foi tão grande que rachou o velho piso de madeira, espalhando os tacos daquele velho quarto como se fosse palitos de picolé.

            - Cara tu tá pesado viu? Você quebrou o chão! Risos
            - Para de gracinha e vem me ajudar!
            - Cara você quebrou o chão!!! Risos
            - Não quebrei não! Essa merda tem um fundo falso!
            - Ué? Como assim? Dona Júlia esconde segredos???
            - Quem sabe né? Talvez ela esconda sua identidade secreta de quando ela era integrante da SS nazista! Risos
            - Você é péssimo Pietro!
            - Você gosta dela porque ela não é a sua mãe! Se fosse você conheceria aquela mistura de Adolf Hitler e Pol Pot em forma de mulher! Stálin perto dela é bichinha!!!
            - Pietro, o que é isso? Realmente tem um fundo falso aqui.
            - Hã? Não mexe aí cara!
            - Calma! Ei!!! Tem livros aqui!
            - Como assim?
- Calma, não são livros, mais parecem diários...
            - Diários??
            - Sim, desde quando sua mãe escreve diários?
            - Desde nunca. Deixe-me olhar isso aí! Estão assinados por...
            - Por quem? Que mistério é esse fala logo.

            Pietro recuou. Sua pele estava pálida e parecia que ele acabara de ver um fantasma, não expressava nenhuma reação, muito menos palavras. Aquilo estava assustando Miguel, pois nunca vira seu amigo assim. Nunca tinha visto Pietro demonstrar o sentimento que ele mais repugnava: medo.

            - Pietro? O que foi?
            - Cara eu preciso ir!
            - Pera como assim? O que aconteceu? De quem são esses diários?
            - Não importa!
            - Claro que importa! Olha o seu estado! O que aconteceu?

            Mal terminara a pergunta e Pietro virou as costas e saiu do quarto como se fugisse de uma alma penada, ele parecia atordoado e mal sabia como se comportar diante daquilo. Miguel o seguira e tentou segurá-lo pelo braço, mas foi em vão. Debaixo do seu braço três diários cuja assinatura repousa no canto direito com um nome simples e ao mesmo tempo poético. Um nome forte que talvez carregasse um lado negro, um passado tristemente esquecido que agora retornara com toda força para reivindicar o seu espaço, o seu direito de se pronunciar, um nome que transportara uma história que fazia pela primeira vez Pietro esquecer a Escola, Alice ou Dalila, que o fizera deixar tudo para trás sem nem ao menos falar com o seu irmão, um nome, um simples nome. Uma assinatura de dor, uma cicatriz, que agora voltava a sangrar: Otelo...