Carpe Diem

E que venha a loucura

E que venha com toda a força

Força que me faça despencar das minhas próprias crenças

Crenças loucas


E que venha a fé

E que venha você

Renda-me!

Lute e enlouqueça também

Fuja da realidade

E se entregue às oportunidades...


Abandone a sua razão insana

E se afogue nesse mar de incertezas

Seja puramente profana

E que o nosso juiz seja a nossa vontade


E que o nosso controle e bom senso sejam passageiros

Viajantes de longa data

E que se percam na nossa odisséia

Na nossa aventura

Com nossa loucura

Buscando o porquê de ainda existir...

(Noturno)

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

CONTINUAÇÃO DO CAPÍTULO III...

Tudo ainda era muito prematuro e eu não tinha dado um bom cartão de visitas, de qualquer forma, eu estava muito mais preocupado com os meus 200 e poucos reais, os quais naquele momento já tinha se transformado em pedrinhas de crack.
            Voltar para casa naquele momento já não era mais opção. Eu nem imaginava com iria explicar o assalto e a perda da mochila, iria ser um verdadeiro inferno, minha mãe reclamando, eu tentando explicar e a certeza que naquele mês ir a escola seria um verdadeiro martírio. Como não tinha opções, resolvi seguir a menina, não tinha mais nada a perder mesmo, e ela tinha sido tão gente boa comigo, seria rude da minha parte não dar atenção a ela, mesmo que eu fosse péssimo em dar atenção a qualquer coisa que fosse.
            - Pronto, chegamos! Eu vou buscar água para você. O banheiro é logo ali, vai lavar esse rosto que eu te faço um curativo. Sua mãe não vai gostar de vê-lo dessa forma.
            - Acredite, ela não vai nem notar. Num precisa pegar água não...
            - Relaxa garoto, água não faz mal a ninguém, desde que nós não estejamos nos afogando...
            Nós rimos juntos e quando menos percebi já pronunciávamos palavras juntos, ela contou sobre a vida dela, sobre como era terrível trabalhar na venda de passes. Muita gente grossa, muita gente mal-educada, enfim muita gente. Eu não falei sobre mim, não via nada de interessante em falar sobre mim, mas adorava ouvi-la, conhecê-la. Vez ou outra contava para ela algumas situações da minha vida, coisas rotineiras e também um tanto engraçadas, era interessante o fato de como nossos gostos se batiam. Cinema, ambos éramos fascinados por ele. Ela me dizia que a magia que ele transmitia era simplesmente encantadora. Sobre várias outras coisas conversamos e o tempo passava de uma forma impressionante. Ela, assim como eu, era fruto de pais separados, história triste e intencionalmente curta, nunca é bom falar sobre isso, eu mais do que ninguém sabia. Sabe aquela sensação de que o dia não foi em vão, era como se os meus problemas estivessem resolvidos e a tranqüilidade que ela me trazia era extremamente aconchegante, e a paz que ela me trazia, nossa! Era bom, muito bom estar com ela...
            Mas como todos nós sabemos nada que é bom pode durar muito tempo, já era noite e eu infelizmente precisava ir para casa. Encarar aquela multidão de reclamações, eu não conseguia entender porque minha mãe reclamava tanto. Nada estava bom o suficiente para que ela ficasse em silêncio por alguns instantes e eu sabia que depois do ocorrido ela iria me perguntar dezenas de vezes a mesma coisa. Aquilo sim, me deixava cansado, sufocado.
            - Onde você estava até essa hora menino?
            - Eu estava...
            - Ué, onde diabos está o seu tênnis? O que aconteceu? Isso na sua camisa é sangue? Brigou de novo menino?! Mas que merda você não faz nada que preste! Comprou os passes?
            - Mãe eu fui assalt...
            - Não me importa o que você fez! Eu quero que você dê conta dos passes e do dinheiro! Você acha que eu trabalho para manter os seus luxos é?
            - Será que a senhora pode me ouvir?
            - Não tenho nada para ouvir de você seu moleque! Fica se envolvendo em confusão como se fosse um galo-de-briga! Quem você pensa que é?! E nem adianta me olhar dessa forma, essa sua cara-de-bunda não me incomoda e quer saber mais, sai da minha frente!
            - Com prazer senhora!
            Agora imagine essa ladainha todos os dias, por quaisquer motivos que fossem, era sempre assim, eu sempre estava errado por alguma razão que nem eu sabia ao certo. Sem o dinheiro, restava a mim, pegar a bike para ir à escola. Contudo, naquele dia, mesmo após a surra, mesmo após o assalto, eu me sentia estranhamente bem. Alice era o nome dela, e aquele nome já invadia os meus pensamentos com boas recordações.
            Não demorou muito e nos reencontramos várias vezes, as conversas sempre ao fim da tarde após o expediente dela no estágio. O fato de estudarmos na mesma escola também facilitava os nossos encontros, o curioso é que eu nunca tinha reparado nela antes, acho que porque eu nunca tinha reparado em ninguém antes, como disse, naquela escola nada me agradava. O pôr-do-sol tornava o clima agradável e a cada conversa que tínhamos aumentava ainda mais o desejo de conversarmos. Poxa, onde ela estava escondida por tanto tempo? Eu não me lembrava de ter conhecido alguém que me deixasse tão a vontade como ela. Garota compreensível entendia as minhas dúvidas e desvendava o meu olhar como ninguém, como diz o poeta, “quem não entende um olhar, tampouco entenderá uma longa explicação” e nós passávamos horas nos olhando como se estivéssemos tendo uma longa conversa só com o olhar, desvendando pensamentos, curiosidades e, sobretudo, desejos. E eu descobri, mesmo que de uma forma extremamente estranha, que tinha encontrado uma grande amiga, mal eu sabia que ela seria o meu grande amor.

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